Paredes frias, bancos corridos e extensos corredores são as imagens que até hoje tinha dos hospitais civis de Lisboa. Imagens que guardo dos tempos de criança, quando as consultas de otorrinolaringologia faziam os meus pais rumar à capital com o rebento, que obrigatoriamente vinha linda (?), com a roupinha seleccionada pela mãe.
Hoje, esta imagem alterou-se. Num hospital civil de Lisboa – o Egas Moniz – dei de caras com pessoas, muitas pessoas sentadas em bancos corridos, paredes pintadas de rosa e pessoas, muitas pessoas, com batas brancas, verdes, amarelas, azuis, verdes com riscas brancas, laranja, fardas cinzentas. Senti-me perdida. Não percebo quem é quem, mas apercebo-me que, contrariamente a quando era pequena, os Seguranças (os de farda cinzenta) têm muito poder, que as pessoas de verde com riscas brancas se sentem importantes.
É curioso este sentimento. Eu que raramente penso nestas coisas, é a segunda vez numa semana que sinto/vejo as minhas imagens de criança alteradas. A outra alteração aconteceu ontem, dia em que viajei de autocarro. Num autocarro apinhado, numa cidade atafulhada de trânsito, percebi que afinal sou racista. Isto se “racista” significar ter Educação.
Depois de uma viagem onde na parte traseira do autocarro uma senhora teimava em entoar cânticos de “louvor ao Senhor Jesus” e de dar “graças ao Senhor Jesus”, e de outras teimarem falar num tom em que é impossível não colocar os ouvidos pré-dispostos à conversa, eis que o autocarro pára e um amontoado de gente tenta sair pela porta respectiva. Surpresa das surpresas, duas pessoas teimam em “remar” contra e, a todo o custo, entrar… pela porta de Saída. Os passageiros barafustam e um pequeno caos instala-se.
A porta fecha-se e os dois homens que acabam de entrar começam a questionar um terceiro: “És racista?”. A resposta não surge. Eles insistem com um conjunto de afirmações que me atrevo a rotular de xenófobas. São dois negros que questionam um branco. Ninguém responde, mas eu questiono-me: “O que é ser racista?”, “Quem é racista?”, “Será que naquele caso não se trata de educação? Ou falta dela?”
Confesso: se ser racista é chamar à atenção para o facto de o outro não ter educação, para o facto de alguém estar a infringir regras então… sou racista! Eu que até ontem sempre olhei para todos de modo igual, que até ontem pensava que nos hospitais quem era importante eram os indivíduos de bata branca e os doentes.
Upa pacima! Que tenho de mudar e actualizar as minhas imagens!